HORA SANTA

Postado dia 09/03/2018

De acordo como os ensinamentos do Padre P. MATÉO GRAWLEI-BOEVEY dos Sagrados Corações (PICPUS), “ A piedosa prática da Hora Santa assenta diretamente nas revelações de Paray-le-Monial, brota do Coração mesmo de Nosso Senhor.
Santa Margarida Maria orava certa ocasião diante do Santíssimo Sacramento exposto. Nosso Senhor apareceu-lhe rutilante de glória: descobriu-lhe o seu Coração, e queixou-se amargamente da ingratidão dos pecadores.

Ao menos, acrescentou, dá-me tu a consolação de satisfazeres pela ingratidão deles, quanto fores capaz.”

E Ele mesmo indicou à sua fiel serva os meios para isso: Comunhão freqüente, comunhão na primeira sexta-feira do mês, e a Hora Santa.

Todas as noites de quinta para sexta-feira, disse Jesus, te farei provar da tristeza mortal que eu quis experimentar no Jardim das Oliveiras: essa tristeza há-de levar-te, sem tu o compreenderes, a uma agonia mais custosa de suportar do que a própria morte. E para te unires a mim, na humilde súplica que então apresentei a meu Pai, em meio de todas as minhas angústias, te levantarás desde as onze horas até a meia noite, para te prostrares, durante uma hora, comigo de rosto no chão, para aplacar a cólera divina, pedindo misericórdia para os pecadores, e para suavizar de algum modo a amargura que senti no abandono dos meus apóstolos, que me constrangeu a exprobar-lhe não terem podido velar uma hora comigo. E durante esta hora farás como te hei-de ensinar.

Noutro lugar diz a Santa. “Ele disse-me naquele tempo que todas as noites de quinta para sexta-feira eu deveria levantar-me à hora que me tinha indicado, para rezar cinco Padre-Nossos e cinco Ave-Marias, prostrada em terra, e fazer cinco horas de adoração, que Ele me ensinara, para Lhe render homenagem na extrema angústia que sofreu em a noite da sua Paixão.

II — HISTÓRIA

  1. A) A Santa — Foi sempre fiel a esta prática: “Não sei”, escreve Madre Grey-fié, que foi uma das suas Superioras, “se Vossa Caridade soube que ela costumava antes ainda de viver comigo, fazer na noite de quinta para sexta-feira, uma hora de adoração desde o fim de Matinas, até as onze, ficando prostrada com o rosto em terra e os braços em cruz. Fiz-lhe mudar de posição só quando as suas enfermidades eram mais graves, e que antes estivesse de joelhos com as mãos juntas e os braços cruzados no peito”.

Não havia cansaço ou padecimento que a atalhassem. Só a obediência à Superiora lhe podia estorvar esta piedosa prática. Porque Nosso Senhor tinha-lhe dito: “Nada faças sem aprovação daqueles que te guiam, para que, havida a autorização da obediência, Satanás não possa enganar-te, pois nada pode contra os obedientes”.

“Quis até impedir-lha totalmente, escreve a Madre Greyfié. Obedeceu à ordem que lhe impus; mas a miúdo durante esse período de interrupção, vinha timidamente ter comigo para me dizer que lhe parecia ser esta medida excessivamente radical, ingrata a Nosso Senhor, e que temia não viesse Ele depois a descontar no dum modo áspero e sensível. Eu, todavia, não cedi; mas vendo morrer quase repentinamente Sóror Quarré com um fluxo de sangue, de que ninguém tinha adoecido no mosteiro, e outras, circunstâncias que acompanharam a perda de tão boa religiosa, restituí imediatamente a hora de oração à nossa preciosa defunta, perseguindo-me fortemente o pensamento, se não teria sido esse o castigo com que me ela tinha ameaçado da parte de Nosso Senhor. Margarida continuou, portanto, a Hora Santa. “Esta cara irmã, dizem as contemporâneas, tem sempre continuado a velar a hora de oração da noite de quinta para sexta-feira até à eleição da nossa veneranda Madre, isto é Madre Lévy de Châteaumorand, que lhe proibiu novamente, e sob a qual não viveu mais de quatro meses.

  1. B) Depois da Santa — Certamente o seu exemplo assíduo e fervor do seu zelo ganharam muitas almas para esta piedosa vigília, institutos religiosos, que se dedicaram ao culto do divino Coração, este exercício foi estimado em grande veneração. Em 1829 o S. P. Debrosse S. J. fundou em Paray-le-Monial a Confraria da Hora Santa que Pio VIII aprovou. O mesmo Pontífice concedeu, em 22 de Dezembro de 1829, aos membros desta Confraria uma indulgência plenária por cada vez que fizesse a Hora Santa. Em 1834 S. S. Gregório XVI estendeu esta indulgência aos fiéis do mundo inteiro sob a condição de serem inscritos nos livros da Confraria, elevada a Arquiconfraria em 6 de Abril de 1886, por intervenção do grande Pontífice Leão XIII. Desde então os Soberanos Pontífices não cessaram de animar a prática da Hora Santa, e a 27 de Março de 1911 S. S. Pio X concedeu à Arquiconfraria de Paray-le-Monial o grande privilégio de filiar as confrarias do mesmo nome, e que estas gozassem de todas as indulgências que ela tem.

III – ESPÍRITO

Nosso Senhor mesmo ensina a Santa Margarida Maria o espírito que há de vivificar este exercício. Recordem-se os atos que o S. Coração reclama da sua fiel serva:

1º Aplacar a cólera divina;
2º Pedir a misericórdia para os pecadores;
3º Reparar o abandono dos apóstolos;
Supérfluo será chamar a atenção para o caráter de amor compassivo e reparador que vivifica estes três atos.

Nem admira, pois tudo, no culto do S. Coração tende a este amor de compaixão e espírito de reparação. Basta ler presentes as aparições do S. Coração à Santa:

Uma vez — diz ela — em tempo do carnaval… apareceu-me, depois da Santa Comunhão, na figura do Ecce Homo, carregando a sua Cruz, todo coberto de chagas e feridas; o seu sangue adorável rebentava de todas as partes, e Ele dizia com voz dolorosamente triste: ‘Não haverá ninguém que tenha dó de mim e queira compadecer-se e tomar parte na minha dor, no estado lastimoso em que me deixam os pecadores, maiormente agora?
E na grande aparição ainda a mesma queixa:

Eis o coração que tanto tem amado aos homens, que nada poupou até se esgotar e consumir, para lhes testemunhar o seu amor: e em paga não recebe da maior parte deles senão ingratidões, com os seus sacrilégios, e a frieza e desprezo, que tem por mim neste Sacramento de amor. E o que me dá maior pena é portarem-se assim precisamente corações a mim consagrados.”

Quem tiver ouvido estas amargas queixas, estas justas exprobações dum Deus ultrajado pela desestima e esquecimento, não se maravilhará de que predomine nestas Horas Santas uma funda tristeza, e um tom de divino apelo. Quisemos simplesmente fazer ouvir o eco fiel dos gemidos inefáveis de Getsémani e de Paray-le-Monial.

Em ambas as ocasiões, Jesus, mais do que falar, parece soluçar de amor e tristeza. Não admira, pois, que a Santa diga: ”Tendo-me a obediência permitido isto (a Hora Santa), não se pode explicar quanto eu sofria nela, porque parecia que este divino Coração vazava no meu toda a sua amargura, e reduzia a minha alma a uma angústia e agonia tão dolorosa, que me parecia às vezes que ia expirar.”

Mas não percamos de vista a mira última a que Nosso Senhor visa no culto do seu divino Coração, isto é, o triunfo deste Coração Santíssimo, o seu Reino de Amor no mundo. Escutemo-lo a Ele mesmo:

Ele deu-me a ver, diz a Santa, que esta devoção era como o último esforço do seu amor, desejando favorecer os homens nestes derradeiros séculos, com esta redenção amorosa, para os arrebatar ao império de Satanás, que Ele queria destruir, para os colocar sob a doce liberdade do império do seu amor, que queria estabelecer nos corações de quantos desejassem abraçar esta devoção.

Noutra parte escreve mais: “Ele reinará, apesar de seus inimigos, e tornar-se-á senhor dos corações que quer possuir: pois é o fim principal desta devoção converter as almas ao seu amor”. Esta promessa profética e consoladora, que vemos hoje realizar-se, anda continuamente na sua pena.
A Hora Santa deve servir, portanto, a preparar e estabelecer o reinado do S. Coração; e na verdade o prepara, mormente se faz pública e solenemente.

IV- PRÁTICA

I — A Hora Santa deve ser uma oração meditada: é um exercício de oração mental, dizem os estatutos, ou de oração vocal, que tem por objeto a agonia de Nosso Senhor no Horto das Oliveiras, a fim de aplacar a cólera divina, etc. Convém, pois, recitar devagarinho as orações que apresentamos e estão calculadas aproximadamente para o espaço de uma hora. Não há-de ser uma simples leitura, mas uma oração cheia de unção e fervor.
Os pontos de suspensão indicam apenas onde convém interromper a leitura para uns momentos de silêncio, que dão a este exercício, tão soberanamente belo na sua profunda significação, um delicioso, espiritual paladar.

Este exercício pode fazer-se particularmente ou em comum, na igreja ou noutra parte, em quinta-feira à noite, das onze à meia-noite, ou desde aquele momento em que é permitido, segundo as regras ordinárias, rezar matinas do dia seguinte (Gregório XVI, Rescrito de 12 Dezembro de 1836).
À Hora Santa, tal qual Nosso Senhor mesmo a ensina a S. Margarida Maria, não é, pois, uma hora de adoração qualquer feita num dia e hora qualquer; não pode nem deve fazer-se senão na noite de quinta-feira. O mais perfeito seria consagrar-lhe a hora das onze à meia-noite. Todavia, para favorecer esta santa prática e pô-la ao alcance de todos os fiéis, a Igreja autoriza a sua antecipação, como já dissemos. Pode fazer-se, portanto, desde as 16 (4 da tarde) ou mesmo desde as 14 (2 da tarde) nos dias maiores. Antes de começar será bem determinar as intenções particulares pelas quais se deseja oferecer.

III — Para ganhar a indulgência anexa à Hora Santa é necessário fazer-se inscrever na Arquiconfraria da Hora Santa. Para isto basta mandar o nome e apelido ao Mosteiro da Visitação de Paray-le-Monial (Saône-et-Loire), ou a alguma das confrarias filiadas. Com esta inscrição não se contrai obrigação alguma de fazer à Hora Santa semanal nem ainda mensal. Mas os fiéis associados dos Sagrados Corações e membros das famílias que reconhecem dum modo particular a realeza do S.Coração, honrar-se-ão de a fazer regularmente, pelo menos na véspera da primeira sexta-feira, e, se tanto for possível, todas as semanas, como fazia a Santa.

As pessoas impedidas de ir ao pé do sacrário, podem fazê-lo em casa diante da imagem do S. Coração entronizado.
Nas comunidades, pensionatos, institutos, etc, mais facilmente se fará de noite, diante do SS. Sacramento exposto, se a autoridade diocesana o permitir.

Note-se que as comunidades religiosas têm o privilégio da inscrição coletiva na qual estão incluídos todos os seus membros presentes e futuros. Todavia, relativamente à indulgência, cada religioso (ou religiosa) não a ganha senão no dia em que pessoalmente faz a Hora Santa. É um privilégio da Comunidade: quanto aos seculares, ninguém pode ser inscrito sem dar pessoalmente o seu nome.

IV — Os associados da Hora Santa podem ganhar uma indulgência plenária, aplicável às almas do Purgatório, cada vez que faz à Hora Santa, e isto nas condições ordinárias: confissão dentro da oitava, ou mesmo quinzena onde isto é permitida — comunhão na quinta ou na sexta-feira — e oração segundo as intenções do Sumo Pontífice nalguma igreja ou capela pública.
Para quem vive em comunidade, com o consentimento do Ordinário (comunidades, colégios, hospícios, etc.) essa igreja é a sua mesma capela, isto é, aquela onde satisfazem ao preceito da missa, menos se tal casa tiver igreja ou capela pública. Todos os que lá moram, como afetos ao seu serviço, gozam do mesmo privilégio.

V — Mais uma palavra sobre a prática: Nestas Horas Santas apresentamos frequentemente o S. Coração sofrendo presentemente os horrores da agonia, como atualmente maltratado e ferido pelas ofensas dos pecadores. Não quer isto dizer que Nosso Senhor possa ainda agora ser magoado com os nossos crimes e pecados. Depois da sua ressurreição já não está sujeito ao sofrimento; a morte e suas conseqüências já não têm sobre Ele domínio algum, desde que venceu a morte com a sua dolorosa morte. Está no SS. Sacramento, como no céu, glorioso e impassível, gozando para sempre e em todo o instante a recompensa das suas obras redentoras. Além de que o modo maravilhoso por que está presente nas Espécies Sacramentais bastaria para o roubar aos nossos ataques ou tentativas criminosas.
Então para que falar assim? Porque assim mesmo fala Nosso Senhor em quase todas as aparições à Santa. Porque Ele ainda assim faz, quando se revela a S. Gertrudes e a outros amigos do seu Coração. Porque durante a horrível agonia do Horto das Oliveiras e durante toda a sua Paixão o seu Coração realmente sangrou aos golpes que os nossos pecados de hoje lhe vibraram. Ele tudo previu, tudo compreendeu, tudo penetrou, e tudo o afligiu mortalmente e esta triste visão arrancou-lhe o suor de sangue.
Apressemo-nos a acrescentar que Ele também previu todas nossas reparações, todos nossos atos de virtudes para o consolar e compensar.
Finalmente porque os nossos pecados atuais são verdadeiros esforços criminosos para ferir e trespassar o Coração amantíssimo do Rei do Amor. Se eles o não tocam… Não é porque não façamos por isso…
Não serão, pois, os nossos delitos e ingratidões, verdadeira causa dos seus sofrimentos e da sua morte cruel, que o fazem falar desta maneira tão adaptada à nossa pobre natureza, tão necessária até para mover e abrandar os nossos corações de carne? “Não haverá ninguém que tenha dó de mim e queira compadecer-se e participar da minha dor, no estado lastimoso em que nos deixam os pecadores, mormente agora?”

V- CONCLUSÃO

Que os sacerdotes e religiosos, todos os apóstolos do divino Coração se lembrem, pois, da significação profunda, e maravilhosa eficácia deste exercício. “As maiores graças que me vinham da sua bondade, eram na sagrada Comunhão e na noite, sobretudo de quinta para sexta-feira, em que recebia inefáveis favores’.
Não esqueçam as promessas do S. Coração em favor dos seus apóstolos: “Parece-me que Ele tinha feito ver que muitos nomes lá (no seu Coração) estavam escritos, por força do desejo que tem de o fazer honrado, e que por isso nunca permitirá que dali sejam apagados.”
Sejam, pois, numerosos os apóstolos e as almas, que santificadas por este amor, possam exclamar, em união com a grande confidente do S. Coração:
Ó Coração liberalíssimo, sê todo nosso tesouro e superabundância. Ah! não consintas que eu seja privada de te amar eternamente. Eu desfaleço com o desejo de ser unida a ti, possuir-te, abismar-me em ti, para mais não viver senão para ti, que és meu asilo para sempre. Que eu não viva senão de ti e para ti. Sê, pois, a minha vida, o meu amor, o meu tudo. Amém.”
Nota. — Prepara-se uma coleção de cânticos para a Hora Santa. Mas desde já agradecemos cordialmente a todos que gentilmente permitiram inserir os seus cânticos, e compuseram outros originais. O S. Coração lhes pague e cêntuplo.”’

HORA SANTA, Doze Exercícios para a vigília da primeira sexta-feira e mais Sete para diversas circunstâncias pelo R. P. MATÉO GRAWLEI-BOEVEY dos Sagrados Corações (PICPUS). Primeira Tradução Portuguesa por P. Alexandre dos Santos, O. F. M. Edição do “Boletim Mensal”,  Braga – 1928